O pescador e o gênio
Havia uma vez um pescador muito velho e muito pobre que vivia com sua mulher e seus
três filhos. Todos os dias ele jogava sua rede no mar apenas quatro vezes e sempre conseguia
colher alguns peixes para o seu sustento.
Mas houve um dia em que ele jogou a rede por três vezes, sempre chamando o nome
de Deus, e das três vezes só conseguiu retirar das águas um burro morto, um pote velho e
algumas garrafas. Na quarta vez em que jogou sua rede sentiu que ela tinha ficado presa no
fundo. Com dificuldade conseguiu retirar a rede e viu que ela trazia uma garrafa de boca larga,
de cobre dourado, que estava fechada com chumbo e trazia o selo do grande rei Salomão.
O pescador se alegrou, pois pensou que poderia vender a garrafa por um bom preço.
Mas sentindo que ela estava muito pesada, resolveu abri-la para ver o que continha. Com sua
faca forçou o chumbo, virou a garrafa para baixo e agitou para ver o que ia sair. Mas não saiu
nada. O pescador colocou-a na areia e então começou a sair de dentro dela uma fumaça, que
foi se avolumando até chegar às nuvens e foi tomando a forma de um gigante, que o pescador
percebeu logo que era um gênio.
Morto de medo, ele começou a tremer. E tinha razão para ter medo, porque o gênio
saudou-o e disse:
- Alegre-te, pescador, que vais morrer e podes escolher de que maneira!
O pescador, apavorado, tentou acalmar o gênio:
- Mas por que queres me matar, se fui eu que te tirei do fundo do mar, fui eu que te tirei
de dentro desta garrafa onde estavas preso?
- O gênio então contou ao pescador a sua história.
Há mil e oitocentos anos, no tempo do rei Salomão, ele, o gênio, se havia revoltado
contra o rei e, como castigo, havia sido preso nesta garrafa e atirado no fundo do mar.
Durante cem anos ele havia jurado que faria rico para sempre aquele que o libertasse.
Cem anos se passaram e o gênio permaneceu na garrafa.
Durante mais cem anos o gênio jurou:
- Darei a quem me libertar todos os tesouros da Terra.
Cem anos se passaram e o gênio continuou prisioneiro da garrafa. Encolerizado, ele
tornou a jurar:
- Agora, se for libertado, matarei aquele que me soltar e deixarei que ele escolha como
quer morrer.
O pescador implorou de todas as formas que o gênio o perdoasse, pois, dizia ele:
- Desta maneira, encontrarás quem te perdoe.
Mas o gênio não se deixou comover.
Aí o pescador teve uma ideia:
- Já que eu vou morrer mesmo, quero que me respondas a uma pergunta. Como é
possível que estivesses dentro da garrafa, sendo tão grande como és? Não posso acreditar
nisso, a não ser que veja com meus próprios olhos.
O gênio, desafiado, converteu-se novamente em fumaça e pouco a pouco foi entrando
na garrafa. Quando o pescador viu que ele estava inteirinho lá dentro, mais do que depressa
fechou a garrafa com o selo. E disse ao gênio:
- Vou jogar-te de volta ao mar e vou construir uma casa aqui. Toda vez que alguém vier
pescar vou avisá-lo para que não te liberte. Desta maneira, enquanto eu for vivo, não sairás de
dentro desta garrafa.
O gênio então lamentou-se e implorou ao pescador que o perdoasse. Mas o pescador
respondeu:
- Eu também te pedi que me perdoasse, que alguém te perdoaria. Mas assim mesmo
quiseste me matar.
O gênio jurou que não lhe faria mal e que lhe daria meios para que vivesse com fartura o
resto de seus dias, se o deixasse sair. O pescador se convenceu e libertou o gênio, que lhe
mostrou uma lagoa rica de grandes peixes, onde o pescador pôde pescar o resto de sua vida.
(ROCHA, Ruth. Almanaque da Ruth Rocha. 1. ed. 14 imp. São Paulo : Ática, 2008, p. 52-54.)